Erlon José Paschoal - retirado de Cultura e Mercado
Nestas últimas décadas acompanhamos em todo o mundo uma série de seminários e debates acerca da diversidade cultural e de seus desdobramentos políticos e sociais, que pressupõem o respeito pelo outro e pelo diferente e a inserção de economias emergentes no cenário mundial, nas quais o produto cultural ganhou um amplo significado nas trocas globalizadas de mercadorias de alto valor agregado.
Necessitamos agora criar pontes entre o conceito de diversidade cultural, em toda a sua amplitude e ramificações, e as práticas a serem implementadas pelas políticas públicas. Nosso país, povoado por civilizações indígenas e colonizado por europeus e afro-descendentes, tornou-se um espaço multiétnico, receptivo a vários processos imigratórios e, por conseguinte, palco de hibridações e miscigenações de toda ordem. A abrangência deste conceito transforma-o também num potente instrumento político de emancipação, não só das mazelas do colonialismo, como também das desigualdades estruturais internas aprofundadas com a globalização.
A miscigenação, aliás, foi vista muitas vezes ora como a degradação da raça, ora como o maior exemplo da democracia racial; e os povos nativos ora foram considerados selvagens em seu estado natural, ora seres especiais dotados de uma enorme quantidade de futuro, por parte dos chamados países civilizados. Esse processo histórico foi o fundamento da criação da nossa identidade nacional.
Hoje a “geléia geral” é o nosso traço distintivo, o nosso orgulho, o nosso valor cultural maior. Por isso é tão necessário considerá-la como referência fundamental nas políticas públicas da cultura. A consciência da diversidade cultural pressupõe, portanto, o respeito mútuo e a convivência pacífica, base para a construção de um mundo mais justo e mais igualitário, de uma nova ética e de novos paradigmas que devem fundamentar a relação entre as várias comunidades.
Inseri-la na agenda político-econômica que vise ao desenvolvimento humano não é um processo fácil, pois altera estruturas de vulnerabilidade e de poder ao propor uma revalorização das identidades culturais e opondo-se aos padrões homogeneizados de consumo cultural.
Assumir a diversidade, portanto, é assumir a própria condição de existência, a história e as heranças, a maneira de ser, de pensar e de agir e, obviamente, as contradições que são, no fundo, a mola propulsora que impulsiona o indivíduo e as comunidades a transformar e a recriar os seus valores e o seu universo simbólico, a partir de linguagens e manifestações culturais das mais diversas origens e matizes.
Num mundo globalizado, no qual prevalece o poder econômico em todas as suas ramificações, é imprescindível e necessário criar mecanismos de defesa da diversidade humana e cultural, fonte da beleza e criatividade, e do prazer de se viver em sociedade.
Não se trata de conservá-la tal como foi ou é, mas de garantir que continue existindo e se transformando, pois ela se fundamenta na inovação, na criatividade e na assimilação contínua de inúmeras influências. Não é apenas herança do passado, mas matéria-prima para um projeto do presente e do futuro que contemple o conjunto da sociedade.
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Gestor Cultural, diretor de teatro, dramaturgo e tradutor. Foi gerente na Secretaria de Políticas Culturais do MinC e é sub-secretário da cultura do Espírito Santo. mais
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